Tradução do texto de Victor Ting originalmente postado no South China Morning Post.
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Quando o empreiteiro Matriz Suen, de 29 anos, recentemente se assumiu gay para os seus colegas de trabalho, ele não imaginava que a sua história pessoal, que tomou muita coragem para ser revelada em uma indústria dominada pela imagem masculina, seria espalhada para outros como uma história cruel.
Foi uma realidade dura para o diplomado, que tinha trabalhado 11 anos em várias funções de colarinho azul antes de perceber que o seu novo espaço de trabalho não estava pronto para aceitar a sua orientação sexual.
Era somente o seu segundo mês de trabalho.
Apesar de se apresentar como uma sociedade cosmopolitana, Hong Kong ainda está tendo problemas com questões LGBT, e essa luta é mais visível nos espaço de trabalho, de acordo com especialistas, especialmente entre os trabalhos manuais estereotipicamente masculinos – e heterossexuais.

A discriminação pode ser desde alvo de piadas sem graça, como no caso de Suen, até serem desconsiderados em caso de promoção. No entanto, isso também se estende para a esfera social, na forma de discursos de mau gosto, silenciamentos ou olhares maldosos no dia a dia.
Suen Yiu-tung, um professor de estudos de gênero na Universidade Chinesa, diz que tais encontros são comuns em ocupações de colarinho azul particularmente nas pequenas companhias locais onde esperasse que os empregados tolerem a discriminação no lugar de trabalho.
“Trabalhadores LGBT em posições baixas não tem muito poder de barganha. Eles normalmente são forçados a aguentar se eles não quiserem estragar as suas relações profissionais com colegas e colocar em risco as suas posições dentro da companhia”, ele disse.
Existem quatro ordens contra a discriminação em Hong Kong baseadas em sexo, deficiência, status familiar e raça, mas a lei contra a discriminação baseada na orientação sexual não está na agenda do governo.
Ricky Chu Man-kin, antigo chefe da Comissão de Oportunidades Igualitárias, as fiscalizações de igualdade da cidade, tinha listado iniciativas contra a discriminação de pessoas LGBT como uma alta prioridade durante o seu governo.
Mas ele amorteceu a euforia por mudanças sociais depois da legalização do casamento homoafetivo em Taiwan, ao pedir que a comunidade, ao invés de “lutar por mudança” focassem em “trabalhar com aspectos menos controversos da descriminação baseada na orientação sexual”, como aquelas relacionadas ao ambiente de trabalho.

Entre 2016 e o ano passado, aconteceram 78 inquéritos ou reclamações sobre discriminação baseada na orientação sexual encaminhados para a comissão. Mas o porta voz disse que a comissão não tem poder legal para resolver essas queixas, seja levando o acusado para a corte ou demandando seções de conciliação entre as partes envolvidas.
“Eu queria que um buraco se abrisse e me engolisse”
Para Matrix Suen, que ainda está no seu emprego como coordenador de projeto porque ele sente que não tem outra opção além de aguentar, o assédio que ele sofre inclui ser chamado de nomes derrogatórios e colegas ficarem falando para outros “tomarem cuidado com ele”.
“Eu fiquei completamente congelado e sem palavras no momento. Parecia tão bizarro e sem sentido para mim trazer a tona um assunto totalmente irrelevante para o espaço de trabalho”, lembra-se Suen.
“Eu queria que um buraco se abrisse e me envolisse”.
Ele também disse: “Eu comecei a pensar duas vezes antes de tirar fotos para documentar o progresso de trabalho de colegas, já que eu não queria deixar uma impressão errada”, se referindo a paranoia de que meus colegas de trabalho pensassem que eu os estava espiando.
Suen Yiu-tung da CUHK disse: “A vida ficou mais difícil como a de Matrix, especialmente quando não existem muitos empregos na indústria e eles querem evitar a reputação de criadores de problemas. Então eles tendem a não levantar a sua voz”.
Enquanto Matrix Suen continua a sua luta, os problemas começaram cedo para Yeo Wai-wai. Ela perdeu o emprego depois que contou a verdade quando perguntaram sobre a sua orientação sexual em uma segunda rodada de entrevistas.

Yeo estava em busca da posição de gerente em uma companhia de marketing em 2011, depois de trabalhar mais de dez anos na indústria, e ela estava otimista sobre as suas chances depois de ser chamada para uma segunda reunião.
Mas quando ela retornou para a companhia, Yeo ficou chocada ao descobrir que não seria questionada sobre o seu conhecimento ou experiências de trabalho durante a entrevista com o gerente senior da empresa.
“Ele perguntou meu nome, e então, na sua segunda pergunta, ele perguntou se eu era lésbica. Eu fiquei chocada e simplesmente respondi que sim. Então ele fez mais algumas perguntas mundanas… e então falou que eu poderia voltar pra casa que ele depois ele me telefonaria”, ela se lembra.
“A ligação nunca aconteceu. O que a minha orientação sexual tem a ver com a minha habilidade de trabalho?”
Tais acontecimentos colocam sob o holofote como membros da comunidade LGBT continuam a enfrentar a discriminação no espaço de trabalho, assim como a falta de políticas de companhias que asseguram a sua proteção.
Cyd Ho Sau-lan, uma ex-legisladora e ativista veterana dos direitos LGBT diz: “O governo deveria tomar a liderança para encorajar companhias a instituírem políticas pró-LGBT”.
“Elas são importantes porque a mudança sistemática irá permitir que todos sejam tratados de maneira justa, ao invés de deixá-los à mercê de alguns poucos gerentes”.
Ela adiciona que mais treinamento deveria ser oferecido para gerentes e empregadores para sensibilizá-los em como se relacionar e respeitar pessoas LGBT.
Uma pesquisa de 2016 da comissão descobriu que 56% dos cidadãos de Hong Kong apoiam leis anti-discriminação na cidade. Em 2018, essa porcentagem aumentou para 70% segundo outro estudo conduzido em parceira com a Universidade de Hong Kong e a Universidade Chinesa de Hogn Kong.
Suen Yiu-tung disse: “O governo sempre disse que Hong Kong não está pronta para essa legislação, mas a verdade é que ela está pronta. É o governo que não está pronto”.
“Tudo o que precisamos é um pouco de liderança política”.
Uma porta-voz do Gabinete de Relações Constitucionais com o Continente disse que mais de 350 organizações públicas e privadas que empregam mais de 550.000 pessoas assinaram um código de práticas contra a discriminação de empregados.
O compromisso centra na manutenção de políticas de trabalho pró-LGBT, mas não tem valor legal.
Existe a tal discriminação reversa?
Para o advogado Martin (Nome ficctício), políticas empresariais mais pró-LGBT e mecanismos de denúncia é o que ele espera ver.
Dois anos atrás, Martin foi transferido da filial britânica de sua empresa por seis meses e disse para o seu empregador que o seu namorado ficaria com ele no apartamento oferecido pela companhia em Londres. A proprietária, porém, viu o casal e perguntou sobre o relacionamento deles.

Martin então recebeu uma mensagem do departamento de logística de sua empresa que a proprietária estava infeliz do seu flat estar sendo ocupado por um casal gay. Ao invés de ficar do seu lado, o departamento disse que ele violou as regras da companhia e não tinha comunicado os seus planos de acomodação adequadamente.
Apesar dele ter reclamado sobre o departamento e ter no final recebido a permissão de morar no flat, ele se sentiu completamente descriminado quando a sua companhia não levou a sério as suas reclamações.
“Eu me senti assustado sabendo da atitude homofóbica do proprietário. Eu não me sentia seguro morando naquele flat sabendo que ela tinha acesso a ele”, contou Martin.
Apesar da legalização do casamento homoafetivo em Taiwan ter animado a comunidade LGBT de Hong Kong a cobrar de autoridades a seguirem esse exemplo, uma onda conservadora começou a se levantar como resposta.
Choi Chi-sum, secretário geral do grupo conservador da Sociedade pela Verdade e Luz, argumenta que novas leis protegendo pessoas LGBT irá levar a uma discriminação reversa contra pessoas heterossexuais, falando que adicionando que falar em educação e conscientização já é o suficiente.

“Legislações anti-discriminatórias irão oferecer privilégios especiais para pessoas LGBT e silenciar as vozes daqueles que opõe a esse estilo de vida”, disse Choi, se posicionando contra o casamento homoafetivo e a adoção de crianças por casais LGBT.
“Se eles querem proteger pessoas LGBT de serem discriminadas em entrevistas de eprego, nós precisamos expandir essa rede para proteger pessoas gordas e feias de serem descriminadas durante o processo de contratação também?”
Suen Yiu-tung descorda da visão de Choi, argumentando que discriminação reversa é um mito, adicionando “todas as ordens contra a discriminação protegem não somente aqueles que estão historicamente em desvantagem, mas também lados opostos”.
“Assim como a ordem contra a discriminação de sexo, ela protege tanto mulheres como homens igualmente de serem discriminados”.
O professor também também mostra a sua preocupação dos cidadãos se contentarem somente com novas leis. Ele reforça que é necessário que programas educacionais andem de mãos dadas com proteções legais.
Para Matrix Suen, a batalha continua, mas ele aprendeu a se manter positivo: “Eu não me arrependo de ter saído do armário, porque isso faz parte de quem eu sou”.
“Eu espero que um dia não exista mais discriminação em Hong Kong, e pessoas LGBT possam se orgulhar na maneira que eles são e na maneira que eles amam”.
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Links relacionados:
Matéria original (Em inglês): While Taiwan has legalised same-sex marriage, Hong Kong is still struggling with workplace discrimination against LGBT staff – is the city ready for change?